segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Meu.


Ela teve um labririnto na infância

aprendeu que quanto mais se perdia

mais se encontrava.

Dentro do labirinto,

compreendeu que não existe um só caminho

que não existe uma só possibilidade

as vezes pela direita haviam monstros

e pela esquerda aqueles sonhos esquisitos de criado-mudo.

Ela nunca teve medo de mostros no armário

apenas de sonhos de criado-mudo.

sonhos de olhos abertos.

Ele nunca abria os olhos enquanto ela gritava.

Ele nunca se movia enquanto ela batia,

ela teria que aprender a gritar

dizia ele

sem ninguém para apartar.

Ela tem que aprender a correr,

dizia ele,

sem ninguém para se agarrar.

Ela tem que andar numa corda-bamba, elegante como uma bailarina.

As vezes preferiria não ter sujado tanto as mãos de terra

mas hoje sente falta de balançar na mangueira

dos livros esquisitos

e de ver o mundo mais mais alto que as outras crianças.

Um dia ele matou uma cobra, pra vingar seu coelho,

ela gostou

depois chorou

nem cobra

nem coelho.

tanto faz.

Obrigada,

por sempre me confundir

e por me fazer fugir

das comidas que eu nunca comi

das orações que eu nunca entendi

das idéias que eu nunca aprendi

das músicas que eu nunca quis ouvir

e do mar, que um dia quis me engolir.


For my father.

with love.

Sacudindo palavras.


O metrô se aproxima.

Elas já podem sentir
aos poucos
o vento
que vai
balançando
seus cabelos
o barulho
que vai
incomodando seus ouvidos

então, elas se olham e gritam:

-Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!!!!

As pessoas ao redor as olham atônitas... só podem ser malucas, afinal, nem crinaças são.

Mas as garotas continuaram a berrar, até todos ao seu redor começarem a se calar. Sem motivo, sem obrigações, sem nada, apenas gritaram e calaram.


Doutro lado do mundo outras questões:


- Vamos pular?

-Vamos.

-E se doer?

- Daí já terá doido, não importa mais.

- Também acho.

-Então vamos?

-Vamos.

E numa cidadezinha da Alemanha, um judeu, que passou 11 meses mais ou menos dentro de um porão, saí para dar uma espiada pela janela, numa noite de bombardeio, seus olhos ardem, há um motivo:

- Haviam estrelas, e elas queimaram meus olhos.

Em algum lugar do atlântico, 3 jovens cantam em alto e bom som um legítimo rock and roll e se embriagam de vinho, licor e poesia.

Na rua Himmel (que significa céu, em alemão), existe uma menina que rouba livros e tem um amigo de cabelos cor de limão chamado Rudy, ela tem vontade de ter um dicionário, ela perdeu o irmão num acidente de trem, ela tem um pai adotivo que toca acordeão e pinta janelas em troca de alguns cigarros, ela lê os livros que rouba para distrair uma senhora que perdeu o filho na guerra, ela tem um amigo judeu que mora num porão, ela já disse indelicadezas para a mulher do prefeito mas frequenta a sua biblioteca para roubar livros e comer alguns biscoitos.

Ela nunca quis beijar Rudy

ela já quis beijar Rudy

mas não o fez

se arrempederia amargamente depois.

Ela já teve um livro feito pra ela

era um livro nazista, descolorido e colorido novamente, especialmente para ela.

a sacudidora de palavras.


todas

essas

vidas que acontecem simultâneamente enquanto respiramos, olhamos estrelas, pulamos e nos embriagamos.


sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Até o fim.




- Porque você insiste em fumar até o último trago?
-Sei lá, não gosto de deixar as coisas inacabadas.
- Pois saiba que esse hábito é por demais irritante.
- Não me importo.
-Óbvio. Você nunca se importa.

(Silêncio)


- Eu bem que poderia encontrar pelo menos alguma ponta de sentido para certas coisas.
- E será possível?
- Talvez.
- Talvez,talvez... não teria uma resposta mais inteligente?
- Eu não sou inteligente, eu odeio as pessoas inteligentes.
- Ok, você não é inteligente.
- Se eu fosse um pouco mais ignorante talvez eu soubesse as repostas, ou ao menos, pensaria que sabia das respostas...
- Eu não me importo com as respostas.
- Eu sei, você nunca se importa com nada.

(Silêncio)


- Por quê insistimos em olhar tão adiante, já sabendo que lá a vista não alcança?
- Eu sempre acho que vai alcançar.
- Um dia eu pensei que tivessem alcançado, mas eram apenas luzes de refletores, daquelas que embaçam nossa visão, sabe?
-Sei sim, eu também ví, não há quem não a veja.
- Eu queria ter alcançado, eu queria que o que tivesse por trás de todos aqueles refletores também tivesse me enxergado.
- Seria bonito.
-Seria.

(Silêncio)


-Ei, não adianta forçar mais, você vai acabar se machucando, quebrando a perna, batendo a testa ou qualquer uma dessas inúmeras fatalidades que acontecem na vida.
-Eu sei, mas eu fui até o final, gastei horas e horas mas ví, ao menos um esboço, mas ví.
- O quê você viu?
- Talvez algo tão sublime quanto um sorrisso.
- Ou sarcasmo?

(Silêncio)